CONTEXTO ENERGÉTICO
SUL-AMERICANO: OS CAMINHOS DA INTEGRAÇÃO REGIONAL
CONTEXTO ENERGÉTICO DE AMÉRICA DEL SUR: EL CAMINO
DE LA INTEGRACIÓN
REGIONAL
Resumo
O presente
trabalho visa analisar os limites e possibilidades de integração regional na
América do Sul, amplamente disseminada desde o início da década de 1990, a partir do setor
energético, um fator de grande importância para as projeções políticas e
comerciais que culminaram na formação do MERCOSUL. A “globalização e integração” passam a ser
vistos como tendências de fundo das relações internacionais, ambos contribuindo
para colocar em foco, o Estado Nacional como força profunda. A fim de se delimitar o tema abordado, é feito um
estudo, acerca da política energética brasileira na América do Sul, analisando
de forma particular a relação Brasil-Bolívia a partir do abastecimento de
gás-natural, tendo em vista que a construção do gasoduto visava uma
possibilidade de integração entre os dois países, que foi ameaçada, a partir da
nacionalização de hidrocarbonetos feita pelo atual presidente Evo Morales.
Palavras
– chave: integração-
América do Sul – energia - Bolívia
Resume
Este estudio tiene como objetivo
examinar los límites y las posibilidades de la integración regional en América
del Sur, generalizada desde principios de 1990, desde el sector de la energía,
un factor de gran importancia para la política comercial y los proyectos que
culminaron en la formación del MERCOSUR ."La globalización y la integración"
se verá como las tendencias en el fondo de las relaciones internacionales,
tanto ayudar a poner en el punto de mira, el Estado Nacional como una profunda energia.Con el fin de delimitar el tema, se
realiza un estudio acerca de la política brasileña de energía en América del
Sur, en particular el examen de la relación de la Brasil-Bolivia del
suministro de gas natural, desde la construcción del oleoducto destinadas a una
posibilidad de integración entre los dos países, que fue amenazado, a partir de
la nacionalización de los hidrocarburos por el actual presidente Evo Morales.
Palavras
– chave: integración
- América del Sur – energía - Bolívia
INTRODUÇÃO
Dentro do
atual contexto de conflitos e crises em torno do abastecimento de petróleo e
gás natural, a questão energética se apresenta como vital
para todos os países da América do Sul, sejam eles grandes ou pequenos
produtores e grandes ou pequenos consumidores. O setor
energético é de suma importância para a sociedade, visto que são inúmeras as
atividades vinculadas à geração, transmissão e comercialização de energia,
sendo até mesmo considerado o sustentáculo do desenvolvimento nacional.
A América do Sul se
constitui numa região do mundo de alto potencial de
integração, o que se confirma a partir das razões abordadas por Herz (2004):
como a geografia continental, cultura e línguas comuns ou muito próximas, baixa rivalidade
interestatal e alto potencial energético. Neste último plano, em particular,
se destacam gás, petróleo, hidroelétrica e biocombustível, cujo aproveitamento,
depende parcialmente de processos de integração da infra-estrutura e economia.
Os processos de integração estão situados no contexto da
globalização, que teve seu marco a partir da Segunda Guerra Mundial, com a
existência definida de uma ordem bipolar global, que implicava simultaneamente,
um conflito de sistemas (capitalismo versus comunismo). No entanto a partir da década de 90 “globalização e
integração” passam a ser vistos como tendências de fundo das relações
internacionais, ambos contribuindo para colocar em foco, o Estado Nacional como
força profunda.
Para uma análise do
contexto energético sul-americano, tornou-se necessário destacar algumas
questões ligadas aos processos de globalização e regionalização, bem como suas
implicações sobre a realidade da paisagem energética sul-americana. Tomamos portanto,
este setor como um possível pilar de integração regional e a política externa
brasileira como importante condutora neste processo.
A
fim de se delimitar o campo de estudo, é feita uma análise da relação Brasil-Bolívia a partir da construção
do Gasoduto Gasbol como parte de uma possível ação estratégica regional
brasileira, visando suprir sua necessidade de importação de gás natural e
ainda, uma maior integração entre os dois países, sendo a mesma, ameaçada pela nacionalização
de hidrocarbonetos feita pelo atual presidente Evo Morales.
1- Apontamentos acerca dos fenômenos da “globalização” e “integração”
Durante a Guerra Fria, a política
americana foi fundamentada numa defesa incondicional contra a ameaça das
potências, apoiando qualquer regime contrário ao comunismo no resto do mundo,
seja em ditaduras ou democracias. Com isso os EUA se aliaram predominantemente
com as ditaduras de várias partes do globo, entre os fins das décadas de 1940 e
1970. Particularmente na América Latina, estiveram apoiando diversos golpes
militares. Esta aliança dos EUA com regimes autoritários explica, em parte, o
antiamericanismo de diversos países latino-americanos nos dias de “hoje”.
Os processos de integração estão
situados no contexto da globalização, que teve seu marco a partir da Segunda
Guerra Mundial (LEIS, 2007). A década de
1950 começou com a existência definida de uma ordem bipolar global, que
implicava simultaneamente, um conflito de sistemas (capitalismo versus
comunismo) e um conflito interestatal entre superpotências (EUA versus União
Soviética).
A
partir de suas análises, Cervo (2007) considera que os integracionalistas, que
buscavam compreensão para a transição da ordem internacional da Guerra Fria, em
direção às questões internacionais dos anos 1990, insistiram sobre o fenômeno
da globalização, mas o aproximavam de outro fenômeno, a integração, visto que
se estabelecia uma espécie de disputa entre ambos, na suposição de que dessa
disputa haveria de resultar o equilíbrio no controle da ordem. De todo modo,
esses dois fenômenos eram vistos como tendências de fundo das relações
internacionais, ambos contribuindo para colocar em foco, o Estado Nacional como
força profunda.
Dentro desta ótica, Cervo (2007)
trabalha suas reflexões em torno de duas idéias centrais. Na primeira, analisa
as duas tendências das relações internacionais de 1990 aos nossos dias, sendo
elas, a globalização e integração, e o papel que desempenham os Estados
Nacionais nesse contexto, tomando nexo entre tais fenômenos na América
do Sul, à luz das experiências históricas regionais, com o fim de estabelecer
modelos para análise das relações internacionais da região. Considera ainda que
a explosão das torres gêmeas em 2001 não abalou apenas os Estados Unidos, mas
pela importância que lhe atribuiu a primeira potência global, tornou-se
problema de todos.
A
experiência neoliberal da América Latina foi tão desastrosa, que revelou a
ideologia sobre a qual se fundava a crença de intelectuais e políticos acerca
da capacidade ilimitada do mercado, em prover o desenvolvimento e o bem-estar e
até mesmo, o fortalecimento econômico. Por outro, a crise do multilateralismo,
que também reverteu a tendência de reforçar a globalização por meio de
instituições, regimes e ordenamentos universais no campo do comércio, das
finanças, da segurança, dos direitos humanos, do meio ambiente etc. (CERVO,
2007, p. 3)
A
América do Sul se encontrava deteriorada no que se refere às suas condições
sociais e econômicas provocadas pelas experiências neoliberais. Foi nesse
contexto que houve o retorno da importância do Estado Nacional, que por sua
vez, encontrou condições favoráveis no ambiente internacional.
O
território sul-americano, contudo, não apresenta unidade de conduta em termos
de política exterior ou modelo de inserção internacional no século XXI, como tivera
na última década do século XX. Não se situam da mesma
maneira no contexto da globalização, e este aspecto deve ser levado em conta no
momento de se definir as estratégias e metas da política externa brasileira.
Soma-se a isso, um fato destacado por Leis (2007), considerando
que a partir da perspectiva da atual globalização, a América do Sul se
apresenta como uma região em relativo declínio, especialmente quando seus
países são comparados com o desenvolvimento de outros, que possuem condições
sócio-econômicas semelhantes, estando situados na Ásia e no Leste Europeu.
Para compreender a dinâmica da América do Sul é necessário partir
de uma análise da evolução dos países, na perspectiva de avaliar o quanto, eles
se aproximaram dos pressupostos da democracia e da economia de mercado. A
experiência internacional mostra, também, que esses pressupostos se
constituíram em poderosas ferramentas para o crescimento econômico dos países
que os adotaram e consolidaram, revelando ainda, que esses pressupostos são
fundamentais para que sejam bem sucedidos os esforços de integração regional.
Segundo Galvão
(2007) a organização de um espaço sul-americano deverá passar por uma
integração energética, como houve na Europa das décadas de 1950 e 1960, depois
do marco da democracia, este seria o fator mais importante de aproximação entre
os países sul-americanos. Devendo buscar-se ainda a criação de esforços
multilaterais e formulação de iniciativas regionais como a União Sul-americana
e uma Carteira Energética Sul-americana, que aumentam as possibilidades do
estabelecimento de um controle pleno sobre a soberania e independência dos
Estados e governos da América do Sul.
1.2- Paisagem energética sul-americana
A vinculação existente entre
energia e integração regional pode se traduzir em oportunidades de cooperação,
mas também em momentos de conflitos. Isto irá depender da forma como se darão
as negociações entre os países vizinhos e dos interesses que estão em jogo. Para Leis (2007) o
potencial de integração energética poderia ser viabilizado com políticas
realistas e progressivas, que envolvam necessariamente atração e garantias ao
investimento estrangeiro e cooperação entre os estados. Não é isto que vem
ocorrendo na região, já que a política do continente interna e externa tem uma
forte marca do oportunismo do curto prazo e da insegurança dos contratos, sendo
estes, derivados da baixa qualidade da cultura política democrática.
O
aproveitamento dos recursos energéticos da América do Sul, depende parcialmente
de processos de integração da infra-estrutura e economia. Para Herz (2004) o
potencial da região inclui: gás argentino e boliviano para Chile; gás boliviano
para Brasil; gás peruano e boliviano para exportação transcontinental de gás
liquefeito; petróleo e gás venezuelano para Brasil, Argentina, Paraguai,
Uruguai e Chile; biocombustiveis e hidroelétrica brasileira para vários paises
sul-americanos e para outros continentes.
A partir de suas análises,
Galvão (2007) considera que a eclosão da temática energética na agenda
sul-americana não é algo novo no século 21. Pelo contrário, configura-se como
mais um episódio do caminho integrativo latino-americano que, desde a década de
1970, tem procurado orientar-se através das oportunidades para o
desenvolvimento nacional. Ao aceitarem os desafios surgidos com a valorização
da temática energética no ambiente internacional, os países sul-americanos
aproveitaram uma onda criadora e transformadora das relações internacionais.
A efervescência
política e diplomática que marca os eventos atuais da América do Sul, como
possibilidades advindas da força do petróleo e dos biocombustíveis, que
culminaram na I Cúpula Energética Sul-americana e do
Caribe [1], conduzem os internacionalistas a compreenderem as origens,
motivações, idéias e decisões que compõem o quadro da política do poder
regional (Galvão, 2007). Nesse sentido, trata-se de olhar para o passado e projetar a
evolução do sistema de relações em que estão inseridos os países
sul-americanos para melhor se
entender o que vem adiante.
Os fatores
energéticos como petróleo, gás natural e elementos radioativos só ganharam
notoriedade e importância com a revolução tecnológica das décadas iniciais do
século 20, fazendo parte de uma característica mais abrangente denominada
“recursos naturais”.
No caso sul-americano os
caminhos da integração energética, encontram varias opções para a sua
consecução. Como discorre Galvão (2007) poderiam ser: regime
energético comum, um complexo de segurança energética regional e uma comunidade
energética sul-americana, mas que parecem ter sido esquecidos durante as
negociações levadas a cabo na I Cúpula Energética Sul-americana e do
Caribe, na qual, o presidente venezuelano expõe o seguinte argumento:
Tenemos que asegurar que nuestros países de Suramérica y del Caribe
tengan energía segura y cercana por lo menos por este siglo, mientras tanto,
debemos dedicar un gran esfuerzo científico y de investigación tecnológica,
para asegurarle a nuestros descendientes un modelo energético racional, porque
algún día el petróleo se va a acabar.
(Pronunciamento
do presidente da Venezuela Hugo Chavez no Programa dominical Aló Presidente
Nro. 282. Apud GALVÃO, 2007, p.18).
Assim, pode-se compreender
que a I Cúpula Energética Sul-Americana e do Caribe, foi convocada para avaliar
novas opções de potencializar a união regional e revisar os mecanismos
multilaterais que têm sido criados para tal fim. Especificamente, se buscou
aprofundar o multilateralismo energético. As linhas definidoras da I Cúpula
energética foram: Integração de infra-estrutura energética, conformação de um
bloco de poder sul-americano e tratamento das fontes energéticas regionais. Busca-se
ainda a Extensão da agenda pela inclusão de outros temas como questão social e
ideológica.
Criou-se, portanto, toda uma
expectativa e uma série de discussões acerca da questão energética, sobretudo,
em torno de dois vetores: a) vetor da competição e b) vetor da
complementaridade.
Pavimentar
os caminhos da união sul-americana é aproximar os espaços amazônico e pacífico
por meio de medidas concretas e factíveis. É um esforço de entendimento do nexo
que se estabelece entre a crescente demanda energética mundial, a tendência à
securitização de alguns setores da sociedade, como ambiental e energético, e o
processo de integração regional levado a cabo pelos países sul-americanos há
varias décadas.
(GALVÃO, 2007, p.2)
A
possibilidade de se fortalecer os laços políticos e econômicos, por meio do
setor energético, como considera Galvão (2007) está amparada ideologicamente em
uma “solidariedade energética sul-americana” que perde ressonância quando
equilibrada pelo socialismo do século 21” de Hugo Chavez. Logo, o panorama energético
regional torna-se indefinido, a partir do momento que não se estabelecem
vínculos de confiabilidade que pautem as relações internacionais
sul-americanas.
2- A Política Energética Brasileira
na América do Sul
No
que se refere ao setor energético brasileiro, Galvão (2007) afirma que o Brasil
possui uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo, já que 35,9% são
provenientes de fontes renováveis, destacando-se o setor hidrelétrico, como um
dos maiores de todo o planeta. Soma-se a isso, suas dimensões, territorial,
demográfica, econômica e política – o Brasil ocupa necessariamente um lugar
central no processo de integração sul-americana. Pode-se notar diversas atitudes
tomadas pelo governo brasileiro, que manifestam sua ação subimperialista neste
território, estando em jogo, diversos interesses, sobretudo referentes ao setor
energético.
Além dos Complexos
Energéticos Sub-regionais, a participação brasileira abre portas para se pensar
em um Complexo
de Segurança Energética do Atlântico Sul, incluindo países energéticos do
continente africano, como Nigéria e Argélia, o que lançaria a América do Sul
com um peso diferenciado nas relações internacionais (GALVÃO, 2007). O autor
busca descrever a situação do Brasil diante da questão energética através da
discussão de quatro vetores.
O primeiro se refere ao
crescimento significativo das preocupações mundiais em torno do aquecimento
global e a conseqüente necessidade de se reduzir as emissões de CO2,
que estimulam a retomada de geração de eletricidade a partir de fontes limpas.
Neste aspecto, o Brasil pode aproveitar seu potencial hidrelétrico e de outras
fontes renováveis para liderar discussões em foros multilaterais e ampliar seu
poder barganha internacionais.
O segundo vetor traz a
seguinte abordagem: como se vive num mundo globalizado de grande competição
econômica e de poderosas Empresas Transnacionais (ETNs), é fundamental como
alicerce de qualquer política externa, fazer avançar seus interesses por meio
da atuação destas empresas no contexto global. A Petrobrás, por exemplo, é
vista por Galvão como um instrumento importante na arquitetura energética
mundial.
O terceiro vetor mostra que
o desenvolvimento mundial do biodiesel e a viabilidade de uso do álcool
combustível criam uma demanda garantida que torna o Brasil um importante ator
no mercado internacional de biocombustiveis. Tal posição tem sido consolidada
cada vez mais ao encerrar importantes acordos regionais com seus vizinhos e
também com os Estados Unidos e Japão. Vale lembrar que o Brasil concentra 36%
da produção mundial de álcool combustível, à
frente dos EUA, que detém 33% dos 42 bilhões de litros produzidos em 2005.
Em quarto lugar, o Brasil é
favorecido pelo clima e pelo solo para o aumento da produção de bicombustíveis,
especialmente os das oleaginosas. Neste aspecto existem divergências sobre os
impactos ao meio-ambiente deste tipo de postura energética de ampliação dos
espaços cultiváveis. Não obstante, vale ressaltar que, a crescente demanda por
álcool no mercado mundial, devido a aspectos ambientais ou econômicos,
representaria, por exemplo, um acréscimo de 5% na composição da gasolina usada
em outros países, o que já seria suficiente, como aponta Pires (2006),
para que a produção atual dobrasse nos próximos cinco anos, fazendo do Brasil
uma “Arábia Saudita” do álcool no mundo.
Em quinto lugar, Galvão
(2007) destaca que o Brasil pode se aproveitar da forte e quase infinita
tendência mundial de crescimento da demanda por energéticos provenientes de
fontes renováveis, para se tornar referência em conhecimento técnico
especializado, podendo realizar acordos de cooperação tecnológica de alto
nível.
Assim, a produção e a
exportação de bicombustíveis, bem como o aprofundamento de pesquisas sobre
novas fontes energéticas e a exploração de fontes renováveis, transformam-se em
alicerce estratégico da política externa brasileira, devendo ser considerados
pelo Itamaraty nos processos de negociação. Contudo, Galvão (2007) destaca, que
ainda parece estar longe de se pensar no Brasil como uma potência energética
mundial, sobretudo pela ausência de um interesse nacional claramente definido
nisso. O esgotamento da matriz energética associada aos combustíveis fósseis
traz duas questões, a busca por alternativas energéticas e a intensificação do
domínio das fontes tradicionais de energia.
Historicamente,
no Brasil, não existiu uma sinergia entre sociedade, formuladores de política
energética, executores e negociadores políticos. No entanto, esta realidade
parece estar sendo alterada, tanto no plano interno como no internacional. Os
destinos da diplomacia brasileira parecem estar sendo modificados pelo
dinamismo do setor energético, que vem se apresentando como fator impulsionador.
Percebe-se que o
espaço público vem ganhando força nas discussões sobre as relações
internacionais do Brasil e com isso a política externa passa a ser matéria da
nação. O fato de os países sul-americanos terem criado certo descrédito acerca
das idéias do Consenso de Washington e a tomada de consciência dos limites do
paradigma neoliberal[2], fizeram com que os mesmos recuassem, visando propostas mais
realistas e pragmáticas de inserção internacional.
A
confluência dos planos geopolíticos e geoeconômicos, como definidores da nova
ordem internacional, faz com que os recursos naturais sejam percebidos como
força motriz da expansão da sociedade internacional. Não existe uma disjunção
entre competição interestatal e capitalista, uma vez que as grandes empresas transnacionais
do setor energético dependem fortemente de uma base nacional para a consecução
dos seus interesses transnacionais. Aprofundam-se, portanto, os laços entre
territorialidade e projeções globais de poder. Em suma, Brasil e América do Sul
testemunham a energia como uma nova dimensão da segurança internacional que
precisa fazer parte de seus cálculos estratégicos e da definição de linhas de
ação internacional.
(GALVÃO, 2007,p.20).
Assim, percebe-se
que diante dos atuais acontecimentos, torna-se necessário avaliar a atuação da
política externa brasileira, revendo as prioridades instituídas pelo governo e
pelo Itamaraty, tendo em vista, sobretudo, o fato de a América do Sul
demonstrar-se como cenário propício para inserção internacional do Brasil.
3- Análise da realidade Brasil – Bolívia a partir do abastecimento
de gás natural
Considerando as questões até aqui, analisadas,
pode-se destacar a relação Brasil-Bolívia, como um caso particular da
geopolítica brasileira assentada na questão energética.
A atuação da Petrobras na Bolívia visou, uma integração do mercado de
gás e petróleo nos países sul-americanos, conforme está previsto em seu plano
de desenvolvimento estratégico. Foi instalada em 1995, entrou em funcionamento
em meados de 2006 e em menos de 10 anos tornou-se a maior empresa do país,
tendo grande participação PIB nacional, e na arrecadação total de impostos.
FIGURA 1. Mapa do gasoduto Brasil-
Bolívia ( Gasbol)

Fonte:
http://www.petrobras.com.br/atuaçãointernacional
acesso 24 de julho de 2006.
A construção do Gasbol
(gasoduto Brasil-Bolivia) foi um marco importante no processo de aproximação
entre estes dois países. De acordo com Vogt
(2001) através do Gasbol, o Brasil recebe grande quantidade de gás natural da
Bolívia, que corresponde a cerca de 51% do total utilizado. A figura 01
ilustrada acima, mostra os locais por onde passa o gasoduto Brasil-Bolívia e os
locais no Brasil para onde esse gás é distribuído.
A
ênfase no gás natural se deu pelo fato de a Bolívia possuir grandes reservas e
por ser um recurso que o Brasil necessita e ainda não produz em quantidade suficiente
para o abastecimento de todo o país.
Em maio de 2006, Evo
Morales anunciou a nacionalização de hidrocarbonetos, na busca de alcançar uma
série de benefícios para o país, como destaca Borges (2006): a preservação da
estabilidade macroeconômica, obtenção de apoio de Hugo Chávez e Fidel Castro
graças às estatizações, a viabilização da assinatura de um pacto socialista de
comércio e cooperação regional, além do aumento na arrecadação total de
impostos sobre a exploração e produção dos hidrocarbonetos de 50% para 82%.
Contudo, Borges (2006)
destaca que, há especulações de que tal nacionalização poderia trazer também
conseqüências negativas para a Bolívia, pois certamente, haveria possibilidade
de oposição dos governos dos EUA e de outros países que possuem empresas em seu
território; bem como o Término das discussões sobre a formação da comunidade
andina das nações; dificuldades do país em gerir a produção do petróleo e
sanções econômicas à Bolívia por parte dos países que exploram petróleo no
local.
Embora por diversas vezes,
Evo Morales, tenha tomado medidas que iriam contra os discursos feitos ao
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a nacionalização, que culminou na saída
da Petrobras daquele país, não chegou a provocar uma “crise” concreta entre Brasil
e Bolívia. O que houve foram desavenças
que puderam ser resolvidas levando em conta uma ação diplomática que não
comprometesse a política externa brasileira na América do Sul.
Contudo, é inegável que a
Petrobras não saiu bem sucedida nesta história, pelo menos na opinião pública
boliviana. Surgiram diversas especulações de que suas ações naquele país
estavam baseadas na obtenção de lucros ilícitos, sendo que, tal questão, jamais
foi comprovada. O que se sabe ao certo é que os lucros, na verdade eram extraordinários,
porém é também considerável o fato de a Petrobras ter inovado tecnologicamente
o setor de exploração e produção de hidrocarbonetos, lhes dando uma dinâmica
jamais vista, sobretudo porque até então, eram obsoletos e pouco operantes.
A partir das medidas,
pode-se dizer que o governo boliviano acelerou as complexas negociações para
assumir o controle de duas refinarias da Petrobras, por US$ 70 milhões, menos
da metade dos US$ 160 milhões solicitados pela empresa brasileira[3]. As refinarias em questão
são Gualberto Villarroel, de Cochabamba, e Guillermo Elder, de Santa Cruz. Para
Lopes (2007)[4], estas duas refinarias
acabaram sendo compradas pelo governo boliviano, no dia 11 de maio de 2007 por
US$ 112 milhões.
De acordo com a Petrobras[5], durante a
sua gestão nas unidades na Bolívia, os investimentos "otimizaram os
processos" e permitiram o aumento de capacidade das refinarias.
Para
o Ministério das Relações Exteriores, as decisões unilaterais da Bolívia sobre
o monopólio na exportação de petróleo e gasolina, que afetam a Petrobras,
poderiam causar um “impacto negativo na cooperação entre os dois países”. No
entanto, a situação veio se normalizando. De acordo com Oliveira (2008) o
governo brasileiro não possui atualmente nenhuma queixa em relação à Bolívia,
que vem sempre cumprindo o contrato assinado com a Petrobras , que prevê a entrega
de cerca de 30 milhões de metros cúbicos diários de gás natural até 2019.
O
Brasil dispõe de capital e
tecnologia, globalmente competitivos em todos os setores ligados à indústria
petrolífera e possui atualmente grandes perspectivas em relação a oferta de gás
natural na bacia de Santos e a prevista com a exploração do pré-sal[6],
no entanto ainda há um grande interesse em continuar importando o Gás boliviano,
sobretudo, por este, ser considerado “um bom negócio”.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Pode-se concluir que é
imprescindível considerar a integração energética sul-americana como uma
necessidade geopolítica frente ao cenário internacional e o Brasil, como um
possível condutor neste processo, através da atuação internacional da Petrobras
que tem ampliado, de forma muito rápida a sua atuação neste sub-continente.
A Energia é um fator de grande importância frente ao cenário
econômico mundial. É um recurso que movimenta a economia e gera conflitos,
podendo ser um fator de aproximação ou então de atrito nas negociações entre os
países, como foi o caso da relação Brasil-Bolívia, frente ao nacionalismo
implementado no governo de Evo Morales.
Deve-se
atentar para o fato de que há uma necessidade de se
superar a grande heterogeneidade de interesses entre os países sul americanos,
visto que contribui para a diminuição do grau de aprofundamento da integração.
Pode-se
dizer que as origens e atualizações da questão energética,
na região, apontam para uma valorização e resgate do acúmulo histórico como
parte de um quadro explicativo sobre o presente. A conformação de uma
verdadeira comunidade de nações da América do Sul, que seja símbolo de
liberdade e glória, parece refletir cada vez mais a extensão territorial do
subcontinente e as riquezas nele presentes.
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*
Pós–Graduanda
em Ensino de Geografia e Licenciada em Geografia pelo Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia de Campos dos Goytacazes/RJ- IFF, bacharel em
Serviço social pela Universidade Federal Fluminense – UFF, professora de
geografia na rede municipal de ensino de São Francisco de Itabapoana – RJ.
E-mail: luanerubim@yahoo.com.br
** Pós – Graduando em Ensino de Geografia e Licenciado
em Geografia pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Campos
dos Goytacazes/RJ- IFF, professor na rede privada de ensino em Campos dos
Goytacazes – RJ. E-mail: diegomorett_7@hotmail.com
[1]A I
Cúpula Energética Sul-americana e do Caribe ocorreu na Ilha de Margarita na Venezuela entre os dias
16 e 18 de abril de 2007.Buscava-se tratar da questão energética no que se
refere ao comércio e abastecimento entre os países vizinhos, no sentido de criar
estratégias de cooperação mútua entre os mesmos, e traçar planos de projetos
comuns. Um dos resultados obtidos foi a criação de um escritório permanente em
Quito, no PEIXOTO, Flávia. Cúpula Energética sul-Americana
começa com parceria entre Brasil e Venezuela.2007 Disponível em
acesso dia 15 de agosto de 2007 às 21:56.
[2]
Parte-se do pressuposto de que o neoliberalismo é um sistema econômico que
prega a intervenção mínima do Estado na economia, deixando o mercado se
auto-regular com total liberdade. O mercado é quem dita as regras e conduz a
produção. Este tipo de pensamento pode ser representado pela privatização e
pelo livre comércio. Informação disponível em
acesso em outubro de
2007.
[3]Informação
coletada na Gaceta Oficial de Bolivia, Ministério de La Presidencia.
[4] Repórter
da Agência Brasil
[5] Atuação Internacional da Petrobras:
disponível
em: http://petrobras.com.br/espaçoconhecer Acesso no dia 23 de
junho de 2006.
[6] A
Chamada camada pré-sal é uma faixa que se estende ao longo de 800 quilômetros
entre os Estados do Espírito Santo e Santa Catarina, abaixo do leito do mar, e
engloba três bacias sedimentares (Espírito Santo, Campos e Santos). O petróleo
encontrado nesta área está a profundidades que superam os 7 mil metros, abaixo
de uma extensa camada de sal, segundo geólogos, conservam a qualidade do
petróleo.Vários campos e poços de petróleo já foram descobertos no pré-sal,
entre eles o Tupi, o principal. Há também os nomeados Guará, Bem-te-vi,
carioca, Júpter e Iara, entre outros. Informação disponível em
acesso dia 16 de fevereiro de 2009.
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